quarta-feira, 23 de maio de 2007

Líderes que Moldam e Mantêm uma Cultura Voltada Para o Desempenho

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James L. Heskett
Leonard A. Schlesinger
Durante os últimos anos, buscamos de várias maneiras descobrir os elos entre comportamento de liderança e desempenho organizacional. Não fomos tão ingênuos a ponto de admitir que a percepção popular do líder bem-sucedido como comandante, controlador, autor de decisão, assimilador de poder e contador de verdades, mais frequentemente instalado em um escritório no andar mais alto e propositalmente isolado das batalhas diárias da organização, seria característica de nossos líderes. Mas nem nós estávamos preparados para o que realmente descobrimos.
Encontramos dirigentes das melhores organizações nos respectivos ‘segmentos’ dos setores social e de fins lucrativos que definiam suas funções em termos de identificar e constantemente comunicar valores comuns a todos, moldando-os de modo a melhorar o desempenho, assegurando recursos para as pessoas a sua volta, vivendo os valores comuns, ouvindo na major parte do tempo e literalmente falando uma linguagem diferente daquela de seus tradicionais colegas. Em resumo, consideravam-se modeladores e defensores de culturas voltadas para o desempenho.
Os líderes de nossa amostra não se limitam a seguir regras. Nem necessariamente representam um estilo de liderança para todas as estações e todas as culturas nacionais. Mas as semelhanças entre as condutas formam um quadro valioso e abrangente que deve proporcionar, a qualquer observador da liderança eficaz na sociedade atual, uma pausa para refletir. Para ilustrar estas semelhanças, citamos apenas seis de uma amostra maior de possibilidades: um uso especial da linguagem, habilidades para ouvir, propagação de valores, aumento das habilidades do funcionário, esclarecimento de valores essenciais e garantia de dignidade.

Falando uma linguagem diferente
A primeira coisa que se observa em nosso grupo de líderes é a surpreendente linguagem que utilizam. Embora a linguagem seja apenas um sintoma, não é um ponto de partida ruim no estudo dos estilos de liderança.
O diretor-presidente do Banc One, de certo modo o banco de grande porte de melhor desempenho nos EUA, definiu sua função como administrador de uma ‘Parceria Fora do Comum’, que favorece o máximo de autonomia local a gerentes criteriosamente selecionados combinada com eficazes serviços prestados centralmente e medidas comuns de desempenho. O presidente do conselho da ServiceMaster, a empresa de serviços de manutenção mais bem-sucedida dos EUA, buscou um ‘coração servil’ como critério básico na seleção de seu sucessor para ocupar a função de diretor-presidente. A ex-chefe da organização que muitos viam como a mais bem conduzida e administrada do setor social, a Federação das Bandeirantes, disse que sua função era assegurar que a organização permanecesse ‘focada na missão, baseada nos valores e orientada pelos aspectos demográficos’, estando este último termo direcionado para a necessidade de maior diversidade na organização. O diretor-presidente da principal e mais bem-sucedida companhia aérea americana, a Southwest Airlines, falou-nos sobre contratar empregados como uma “experiência quase religiosa”.
Esta não e a linguagem que se espera de líderes inflexíveis e ‘durões’. Mas falar de forma dura com os outros aparentemente não produziu o tipo de resultado que estes líderes realizaram.

Ouvir versus falar
Os gerentes da linha de frente são muitas vezes treinados a ouvir as necessidades dos clientes. Aqueles que se desempenham bem são geralmente recompensados com promoções que os colocam distantes dos clientes. A cada sucessiva promoção cresce a procura pela ‘palavra’ deles, e são muito venerados. Costumam adquirir o hábito de falar mais e ouvir menos. Este comportamento é contrário ao da liderança que encontramos em nossa pequena amostra de organizações voltadas para o desempenho.
O diretor-presidente do Banc One é conhecido por negar que tenha algum conhecimento de como conduzir os muitos bancos que administra. Em vez disso, considera que seu papel é observar os números do desempenho, ouvir as solicitações de ajuda dos associados e assegurar que estes sejam colocados em contato com colegas que possam ajudá-los. Para incentivar todos na organização a ouvir, o presidente do conselho e anterior diretor-presidente da ServiceMaster exigiu que todos os gerentes passassem um dia fora dos escritórios limpando os assoalhos, paredes e banheiros, ou servindo refeições aos clientes e clientes de clientes. 0 que descobriram foi útil. Os símbolos enviados aos empregados e clientes foram inestimáveis.
A maior parte dos dirigentes de nossa amostra e suas organizações pratica a política de ‘portas abertas’, muitas vezes associada com as organizações paternalistas do passado. Por exemplo, o diretor-presidente da Southwest Airlines vai aos Empregados (sempre em letras maiúsculas nesta companhia) se estes não forem até ele. Isso possibilita ouvi-los melhor. A ruptura com o passado provém do que fazem com a informação. Em vez de utilizá-la para agir contra alguém, eles a utilizam frequentemente para lançar novas iniciativas ou colocar as pessoas em contato umas com as outras, promovendo a assistência e o suporte mútuos. A proporção que as informações são usadas dessa maneira, a organização age e reage.

Vivendo os valores
Em nossa pesquisa, descobrimos que organizações com fortes culturas não fazem jus ao sucesso e a longevidade. Aquelas que abraçam valores que honram e apóiam a adaptabilidade, sim. Estes valores recompensam a sensibilidade às necessidades de clientes, empregados, fornecedores e outros importantes grupos de interesse. Eles são afirmados com termos como o antigo lema do Banc One, “pessoas que se importam”; o objetivo ‘fim’ na ServiceMaster de “ajudar as pessoas a se desenvolverem” (complementando um objetivo ‘meio’, “crescer rentavelmente”); um objetivo de “ajudar cada bandeirante a atingir seu potencial máximo” para a Federação das Bandeirantes; e uma ênfase sobre a ‘família’ na Southwest Airlines, para quem a ‘família’ incluía clientes bem como empregados.
A adaptabilidade requer uma série diferente de comportamentos de liderança. Os executivos do Banc One viajam constantemente para conseguir oportunidades de ouvir diretamente. Na ServiceMaster, os executivos seniores trabalham lado a lado com os empregados das empresas clientes e se engajam em extensos trabalhos externos de caridade. Na Federação das Bandeirantes, a antiga diretora-executiva usava de modo coerente a mesma linguagem para transmitir a missão e os valores da organização, indicando-nos que “o poder da linguagem é muito importante neste trabalho”. Na Southwest Airlines, o presidente conduz o trabalho na obra de caridade adotada pela ‘família’, casas de Ronald McDonald, e mais de 90 por cento dos Empregados da empresa se engajam em atividades semelhantes em suas comunidades.

Garantindo recursos para o empregado
Nossa pesquisa, baseada em um grande grupo de organizações de alto desempenho, conduziu-nos a um dos segredos mais bem guardados do sucesso competitivo: os determinantes mais importantes do lucro e do crescimento são a satisfação e a lealdade do cliente, fatores diretamente relacionados com a satisfação e a lealdade do empregado, além da conseqüente produtividade. Diversas vezes, empregados nos disseram que a disponibilidade de recursos para fazer seus trabalhos é o mais alto determinante de sua satisfação. Os recursos são desenvolvidos de várias maneiras, no mínimo através da eficaz seleção e atribuição de função, treinamento, apoio tecnológico adequado e esforços para colocar os empregados em contato com aqueles que podem ajudá-los. Líderes notáveis que observamos sabem disto e, por conseguinte, dedicam-lhe tempo.
A noção central da Parceria Fora do Comum no Banc One é o abastecimento do pessoal dos ‘balcões’ de operações bancárias locais, responsáveis pelas relações com clientes varejistas, com notáveis produtos, processos e tecnologia de apoio. A ServiceMaster gasta muito mais do que seus concorrentes para desenvolver materiais, equipamentos e processos de limpeza que assegurem qualidade e produtividade máxima no trabalho do pessoal que supervisiona, e para treiná-lo em seu uso. Durante anos, a Federação das Bandeirantes patrocinou o que, de certo modo, veio a ser um dos maiores programas mundiais de educação em liderança além do militar. Com mais de 750 mil voluntárias, muitas das quais estão comandando pela primeira vez, ela considera o treinamento de liderança a chave da capacidade individual e organizacional. Na Southwest Airlines, a diretriz é: “Faça para o cliente tudo o que você se sinta à vontade de fazer”. Isto significa não somente que funcionários tem a amplitude necessária para a ação, mas também que têm informação e base para fazê-lo inteligentemente e dedicação para fazê-lo de modo a preencher as necessidades da empresa e de seus clientes. Os líderes dessas organizações têm um interesse pessoal em garantir a capacidade de seus associados. Como disse o diretor-presidente do Banc One: “Deixar as pessoas certas nos lugares certos é tudo o que eu tenho a fazer”.

Definindo, moldando e utilizando valores essenciais
No coração da nova liderança está a redescoberta da necessidade de definir, moldar e usar valores essenciais comuns da organização. Observe que dissemos ‘redescoberta’. Isto não é novo. E algo que os fundadores de algumas das maiores empresas intuitivamente reconheceram como importante nos princípio da atividade empresarial americana. Um diretor-presidente da IBM observou que os valores essenciais da empresa são tão atuais quanto em 1960, quando fez todos recordarem a importância do respeito pelo indivíduo, atendimento ao cliente e excelência, valores com os quais seu pai criara a empresa. Hoje em dia, é muito raro que valores sejam definidos, moldados, comunicados e usados, mas isto sempre é feito nas organizações cujo desempenho chamou nossa atenção.
O processo de definição e comunicação requer liderança. É o diretor-presidente do Bane One que periodicamente valida a importância e comunica os elementos da Parceria Fora do Comum. Os valores subjacentes a essa parceria são aplicados sempre que cada uma das muitas perspectivas de aquisição do banco são avaliadas; elas devem ter integridade e competência para se gerenciarem. Na ServiceMaster, os valores são revistos como parte de um processo de planejamento de grande alcance a cada cinco anos, sob a liderança do diretor-presidente. Aqui, também, os valores são usados como um gabarito para avaliar a administração de potenciais aquisições. Com a mesma relevância, estão sendo codificados para auxiliar a empresa na seleção de gerentes na organização. As bandeirantes na Federação das Bandeirantes são fiéis a Promessa e a Lei, recitadas anos mais tarde por muitas de suas ex-integrantes. Elas são revistas, embora raramente alteradas, como parte do ciclo de planejamento, cuja duração é de três anos. Na Southwest Airlines, uma equipe de Empregados, encarregada de projetar iniciativas que ajudem a manter a cultura da empresa, obtém sugestões junto a um diretor-presidente carismático, que dedica grande parte de seu tempo para comunicar valores comuns a todos em uma organização de rápido crescimento.

O poder através da dignidade
Nenhum dos dirigentes das organizações de alto desempenho observados se qualificaram como estereótipos da filosofia de liderança do tipo ‘tomar conta’. Eles detêm imenso poder, mas o exercem através de métodos que sugerem uma redefinição do termo. Uma importante fonte de seu poder reside na dignidade que nutrem em todos a sua volta e em todas as camadas organizacionais.
Aqueles que estudaram o poder especificam-lhes as fontes em termos de poder derivado da posição (ou conferido pela), poder derivado da especialização (conhecimento da função), atração pessoal (apelo emocional) e esforço (compromisso pessoal). Nossos líderes são especialistas em muitas áreas e, certamente, parte de seu poder resulta deste fato. No entanto, esta qualidade não reside no conhecimento das funções dos outros ou da capacidade de se revelarem como especialistas. (Quando questionado sobre como explicava o desempenho da organização, o diretor-presidente da Southwest Airlines disse, “gostaria de atribuí-lo a brilhante liderança, mas não posso. É o pessoal da companhia e a sensibilidade que têm para com os clientes e entre si.”) Estes líderes confiam pouco nas tradicionais concepções de autoridade posicional e não parecem evidenciar que suas posições foram consolidadas por esforços hercúleos. Ao contrário, seu poder reside em áreas de especialização que já descrevemos aqui: uso da linguagem, habilidades para ouvir, propagação de valores, aumento dos recursos do empregado, esclarecimento de valores essenciais e garantia de dignidade. Além disso, ele também reside na capacidade de promover relações, tanto entre eles e os outros como entre os outros. Poder relacional é, portanto, um termo que poderia ser acrescentado ao léxico.

Mantendo a cultura
Os presidentes das organizações analisadas entendem a vantagem competitiva que o correto tipo de cultura confere, e trabalham para preservá-la. Em nenhum outro momento isto é mais importante do que durante a busca e a preparação de um sucessor. Este processo levanta um número de questões ainda sem resposta nas organizações de nossa amostra. Todavia, nossas observações sugerem vários padrões que precisam ser testados através de um estudo mais extenso, durante um período de tempo maior, e abrangem o seguinte:
  1. Existe pouca motivação ou razão para procurar sucessores fora da organização. Por exemplo, na ServiceMaster e na Federação das Bandeirantes dos EUA, as duas organizações aqui descritas que passaram por uma transição de liderança, foram escolhidas pessoas internas.
  2. Culturas fortes e adaptáveis são conduzidas por pessoas que tentam parecer dispensáveis à organização; os membros desta, entretanto, quase sempre as consideram indispensáveis, o que gera uma tensão difícil de aliviar. Por exemplo, na Southwest Airlines, existe um forte sentimento de que o atual diretor-presidente é insubstituível, não importando o modo cuidadoso com que ele tenta afastar a idéia e instalar mecanismos que assegurem a preservação da cultura.
  3. Os sucessores nestas organizações não são desenvolvidos da noite para o dia. Eles precisam fazer parte da cultura durante algum tempo.
  4. Uma íntima associação com a atividade principal da organização pode resultar em sucessores bastante receptivos a cultura e muito contrários a adaptação que fortes culturas requerem. Consequentemente, a combinação ‘externo-interno’ quase sempre demonstra máximo sucesso na geração da continuidade da liderança que nossas empresas de excepcional desempenho demandam. Na ServiceMaster, onde ocorreu a mais recente transição, o novo diretor-presidente anteriormente liderava as atividades de produtos de consumo da empresa, a mais nova das duas importantes linhas de negócio, depois de ter ingressado na empresa vários anos atrás, através de uma aquisição feita, em parte, em virtude dos valores de sua antiga organização. Ele é o externo-interno quintessencial.
Liderança, cultura e desempenho
Não acreditamos que tenhamos descrito conceitos vagos sobre liderança. Os líderes dos quais traçamos perfis ajudaram a produzir alguns dos melhores desempenhos já vistos nos segmentos representados por suas organizações. Eles não descobriram por acaso uma fórmula secreta para o sucesso competitivo. Eles sabem o que estão fazendo e se esforçam tanto, de forma consciente, para cumprir seu papel, e eles o desempenham tão bem que muitas vezes ele se transforma em uma segunda natureza, excluindo qualquer possibilidade de gerência por manipulação. De tempos em tempos, a liderança em organizações concorrentes tem-se aproveitado de um ou mais comportamentos observados e tentado imitar os líderes dessas organizações de formas que bem poderiam ser consideradas manipuladoras. Os resultados foram previsivelmente desastrosos; isto confirma mais uma vez a possibilidade de existir um forte elo entre liderança, cultura e desempenho — em resumo, a liderança mais atual e sofisticada produz notáveis resultados empresariais.

James L. Heskett é professor universitário de Logística na Faculdade de Administração da Universidade de Harvard. E autor de Managing in the service economy (Administrando na economia de serviços) e co-autor de A cultura corporativa e o desempenho empresarial, Service breakthroughs: changing the rules of the game (Rupturas na prestação de serviços: mudando as regras do jogo) e The service management course (O curso de gestão de serviços). Leonard A. Schlesinger é George Fisher Baker Jr., professor universitário de administração, diretor-adjunto sênior e diretor de relações externas na Faculdade de Administração de Harvard. É autor de mais de quarenta artigos e oito livros, entre eles The real heroes of business... and not a CEO among them, com Bill Fromrn, e Out in front: building high-capability service organizations, com James L. Heskett.